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 WOLFGANG MARTINI - PY3ACD

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WOLFGANG MARTINI - PY3ACD

 

“Como tantos garotos da minha idade, procurando colaborar para uma melhor renda familiar, também eu estava determinado a arranjar o meu primeiro trabalho remunerado.

 

Ainda sem qualquer formação profissional e apenas com o curso ginasial incompleto, obtive o meu primeiro emprego aos 14 anos de idade. Os testes vocacionais eram até então pouco difundidos e o minguado salário do menor era sempre definido arbitrariamente pelo empregador. Todos almejavam trabalhar, de preferência nos escritórios de alguma empresa de renome, pois, além de uma possível ascensão profissional futura, também pagavam um melhor salário.

 

E foi assim que, em março de 1953, ingressei nos quadros da VARIG, para exercer a função de estafeta na Estação-Rádio ZVA-2, localizada no antigo aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre.

 

O meu serviço consistia na coleta, e posterior distribuição, das mensagens a serem retransmitidas pelos radiotelegrafistas no chamado Serviço Fixo. Eram uns dez a quinze operadores por turno, os quais cobriam todo o país e interior do Estado. Outros quatro ou cinco trabalhavam no Serviço Móvel e mantinham um contato permanente com as aeronaves em vôo.

 

Junto à Estação funcionava também o Serviço de Meteorologia, local onde era elaborado o QAM, o qual, com os demais boletins meteorológicos coletados em todo o Brasil, eram transmitidos em horário e freqüência predeterminados. Bastante ativo também, era o Serviço de Telex, interligando, já naquela época, a Estação-Rádio com o Departamento de Reservas, no centro de Porto Alegre.

 

Apesar das minhas tarefas pouco complexas, o ambiente na Estação era muito empolgante. O luzir dos equipamentos repletos de instrumentos, botões e chaves, os manipuladores e vibros... e tudo isso ainda, envolvido pelo constante som do CW, exerceram um enorme fascínio sobre este, então, guri de apenas 15 anos incompletos. Seriam estes os primeiros sintomas de contágio do Vírus Radiofreqüência? Talvez. Naquele momento, porém, eu já havia tomado uma decisão: me tornaria um radiotelegrafista profissional e o primeiro desafio seria aprender esta adorável sedução chamada cedáblio.

 

Em breve descobri que um dos operadores (Lio) ministrava um curso de telegrafia na sua casa e a única exigência era saber, de cor e salteado, o Alfabeto Morse. Ele residia no bairro Auxiliadora, em Porto Alegre, e eu, aqui, do vizinho município de Canoas, viajava diariamente de trem e de bonde, uns quarenta quilômetros depois do trabalho. Lembro-me que chegava em casa já tarde da noite, cansado, mas feliz, pois estava assimilando o “da-di-da-di” sem dificuldades.

 

Após alguns meses de aprendizado, mais um breve período como radioescuta num dos canais de operação, e eu estava apto para o tráfego radiotelegráfico. Mas, minha alegria durou pouco. Enquanto aguardava o meu eventual aproveitamento na nova função, fui informado de que o Ministério do Trabalho proibia a profissionalização de menores neste serviço. “Faz mal pra cabeça”, diziam. Hi! Hi! Então, é só uma questão de tempo, pensei.

 

A opção como futura profissão, porém, já estava feita. O vírus havia incubado.

 

Decorridas algumas semanas, todavia, desmotivado e sem maiores perspectivas, acabei pedindo o meu desligamento... Não queria mais continuar como estafeta e, decidi então, trabalhar, até atingir a maioridade, na companhia de meu pai.

 

Nesse meio tempo, ensinei telegrafia para o meu mano, e quando este foi servir, não teve maiores dificuldades em se tornar radiotelegrafista e, posteriormente, operador da Estação PUE-2, do QG, da Quinta Zona Aérea. E este era também o meu desejo; afinal de contas, eu agora já tinha dezoito anos e sentaria praça em janeiro.

 

Mas, casualmente, no ano de 1957 o quadro de operadores da FAB se manteve inalterado, não havendo necessidade de novos cursos para o provimento de eventuais vagas... Puxa! Até quando esta munheca, já indócil, continuaria ainda inerte? Talvez, no próximo ano abrirão novas vagas, me diziam... É, talvez... Só que eu não estava disposto a ficar um ano inteiro sem nada estudar, e acabei me inscrevendo no Curso de Suprimento Técnico. Foi um excelente curso, como todos aliás, que a FAB propiciava. Só não podia imaginar que seria justamente através dele que eu chegaria à radiotelegrafia como profissional.

 

Três anos haviam-se passado, quando, na função de Almoxarife na Base Aérea, recebi a primeira notícia sobre o “VE”. Não era propriamente um curso, mas sim, um pacote de exames, nos quais, uma vez aprovado, o candidato era incorporado num prazo máximo de trinta dias, na condição de Voluntário Especial, já graduado como sargento radiotelegrafista. Eis a minha grande chance! exclamei...

 

Eu dispunha agora de exatamente dois meses para me preparar conforme extenso programa. E dar baixa, pois uma das condições era ser civil. As provas eram diárias, eliminatórias e limitadas pelo tempo. A inexperiência em tais concursos me foi fatal. No intuito de obter uma nota máxima, e totalmente absorto nas questões em si, acabei me esquecendo do tempo. Tirei nota zero em geografia. Era a última prova e o tempo havia-se esgotado. E lá estava o agora ex-cabo 113 - Martini, sem a farda, sem emprego e sem dinheiro. E a nossa querida Força Aérea com um radiotelegrafista a menos... E dos bons, pensava comigo. O azar era deles...

 

Mais ou menos nesta época, o mano PY3AXH, hoje PY5GM, estava sendo transferido para o interior do Estado, e para que ficasse de certa forma assegurada uma comunicação bilateral entre nós, também ingressei na RNR. E foi, por conseguinte, uma grande alegria quando em fevereiro de 1962 recebi a minha primeira Licença Classe B, indicativo de chamada PY3BML, hoje PY3ACD.

 

Finalmente, poderia dar vazão aos meus dotes cedablísticos! Hi! Hi! E, coincidência ou não, a minha vida, a partir daí, tomou outro rumo. Foi semelhante a uma Yagi direcional de três elementos, uma girada de 180 graus. A melhora foi sensível.

 

Os meios de comunicação eram, naquela época, ainda muito precários. Uma correspondência da Capital para o interior e vice-versa, levava, em média, 20 dias. O telefone, através de linha física e com sistema de chamada a magneto, com manivela, era um “sarrinho”. Uma estação de radioamador era, portanto, um meio bastante eficiente para contatos de média distância. Além dos QSO, praticamente diários, com o mano, agora residindo em Bagé, eu recebia também para posterior QSP, via bicicleta, notícias de colegas do interior e também de outros Estados, sobre saúde, viagens e falecimentos de parentes aqui residentes.

 

O meu primeiro XMTR, me recordo bem, tinha as dimensões de uma caixa de charutos. Na saída como PA, usava uma EL34 com 300 volts em placa, puxando uns 50mA. Possuía VFO e saía exclusivamente em CW. O sistema irradiante era um Dipolo Dobrado, alimentado com linha aberta. O RCVR era um “noveleiro”, também “home made”, mas sem qualquer recurso adicional para a recepção em A1A. O batimento dos sinais, era obtido com a colocação de outro receptor ao lado, e sintonizado próximo à freqüência de recepção. Com este recurso, os sinais de pura CC tornavam-se audíveis. Hi! Hi!

 

O meu primeiro QSO, no entanto, apesar de tudo checado e conferido, foi um fracasso em termos operacionais... Na expectativa sobre o alcance e a qualidade dos sinais emitidos, lancei o meu primeiro CQ. A resposta foi imediata e me lembro que era um sinalão. Mas logo depois dos cumprimentos de praxe, descobri, entre surpreso e apavorado, que eu havia atingido apenas o 4º Distrito do município de Porto Alegre, distante uns 15 quilômetros em linha reta, e a estação contatada pertencia à rede estadual da nossa gloriosa Brigada Militar... “Vigi”, que susto!

 

Eu estava “saindo” bem abaixo dos 7 MHz. Mas também, pudera! Toda a faixa dos 40 metros ocupava apenas uns vinte milímetros na escala do meu receptor! Hi! Hi! Ainda bem que o operador da Brigada Militar mostrou-se sensível às minhas escusas, pelo QRM involuntário, pois deu-me uma RPRT completa, e após elogiar a qualidade dos meus sinais, enviei-lhe um cordial 73 e fiz QSY...

 

Já na segunda tentativa, subindo um pouco de freqüência, fui atendido por um tal de Flores. Operador da VARIG? Indaguei, pois de lá eu conhecia um operador de nome idêntico. Não, respondeu-me. Ex-comandante do Destacamento Militar de Santa Maria, completou.

 

“A la fresca tchê!” exclamei. Agora é o III Exército... Ainda vou acabar preso com esta minha danada caixinha de charutos... Mais tarde vim a saber que se tratava de PY3APN, um grande sujeito, bonachão e excelente cedablista. O seu indicativo de chamada eu não havia copiado, pela emoção do momento, mas já estava dentro da faixa dos 40 metros, e isto era importante. Hi! Hi!

 

Em abril de 1962, graças ao meu Curso de Suprimento Técnico da FAB, logrei ingressar na Obra de Construção da REFAP, aqui em Canoas, na função de Almoxarife. Passados alguns meses, entretanto, com a chegada dos primeiros caixotes no Almoxarifado e conferindo a documentação correspondente, vi que se tratava de diversos equipamentos destinados à futura Estação-Rádio da Refinaria.

 

Com o coração batendo mais forte e na condição de radioamador, me apresentei ao técnico recém-chegado do Rio, para auxiliá-lo na montagem e instalação da Estação PPA-64.

 

Juntos trabalhamos durante alguns meses, instalando transmissores, cujas potências variavam entre 50 e 1000 watts, receptores de freqüência fixa e variável. Todos os equipamentos eram de fabricação nacional e as antenas eram do tipo dipolo de meia onda, alimentadas por cabo coaxial.

 

E o meu sempre alentado sonho de guri, de um dia ser radiotelegrafista?...

 

Pois bem, para ser rádio-operador na Petrobrás era condição “sine qua non” possuir o Diploma Internacional de Radiotelegrafista de 1º Classe e, não me restou outra alternativa, senão através da Escola Édison, no Rio de Janeiro. Cumpre-me registrar que a REFAP assumiu todas as despesas referentes ao curso, passagens e estadia e, ao retornar do Rio de Janeiro, com base nos exames finais prestados, sentia-me muito feliz, pois tinha a certeza de que desta vez eu estava a um passo do meu ideal!

 

A confirmação não demorou. Passados alguns dias e lá estava eu, após anos de frustração profissional, com o manipulador à minha frente, transmitindo as primeiras mensagens de tráfego, tal qual faziam os operadores da ZVA-2, há dez anos atrás! Foi um deleite, eu estava realizado...

 

Uns anos depois, com o advento do Telex, dos potentes transceptores de microondas, com suas antenas parabólicas, os meios físicos de transmissão e os sistemas radiotelegráficos tipo Morse, foram aos poucos substituídos pelas máquinas impressoras. Inicialmente, os equipamentos permaneceram ainda fora do ar, como reserva fria; em breve, porém, todo o sistema seria desativado.

 

Quando a obra de construção da REFAP transformou-se em Unidade Permanente de Refino, também eu já havia subido um pouco de freqüência. Hi! Hi!... Da função de rádio-operador, eu havia sido promovido a Dirigente da Estação-Rádio e quando se efetivou a centralização dos diversos Sistemas e Redes, incluindo também o pessoal técnico de operação e manutenção, no recém-concluído Centro de Telecomunicações, fui designado para a sua Gerência, cargo no qual permaneci até fins de 1974, quando então novas oportunidades de trabalho se apresentaram.

 

Inicialmente fui convidado à trabalhar na ampliação da Usina Termelétrica da Eletrosul, em Santa Catarina, na cidade de Tubarão, como assistente técnico na área de materiais. Já com alguma experiência colhida nos canteiros-de-obra da Petrobrás, e graças ao alto nível das equipes formadas por técnicos vindos de outros estados e também do exterior, foi possível desenvolver um bom trabalho. Mas apesar do ótimo ambiente de trabalho, da razoável remuneração e do clima aprazível da região, a saudade era danada, e por conseguinte o meu QTH parecia mais distante à cada mês. Sentia muita falta, não só do meu xtal e das gurias, mas também desta minha latente paixão, o pica-pau. E foi assim que num dia qualquer de setembro daquele ano, para espanto geral dos amigos e colegas, decidi retornar pros pagos. Fechei a conta no “Palermo”, joguei a mochila no banco detrás do meu Fusquinha/75 e voltamos para casa.

 

Logo a seguir ingressei na Empresa Wotan S.A. – Máquinas Operatrizes, no vizinho município de Gravataí, para um novo desafio: desenvolver um sistema de “follow-up”, no Departamento de Compras e implantar rotinas diversas inerentes à Administração de Materiais. Responsável pelas áreas de Planejamento e Normas, colaborei ainda como intérprete e tradutor, funções nas quais permaneci até me aposentar em novembro de 1996, após 43 anos ininterruptos de trabalho.

 

Hoje, estou em casa e procuro auxiliar com este “know-how” adquirido, todos aqueles que na sua rotina diária, quer no estudo ou no trabalho, vivem o problema da tradução de textos técnicos redigidos na língua alemã.

 

Mas é no radioamadorismo que a inesquecível telegrafia, única modalidade  que pratico com entusiasmo, continua exercendo o mesmo fascínio de mais de cinqüenta anos. E não é para menos, pois é ali que o desafio é uma constante, e cada um pode ir ao encontro dos seus próprios limites. Os manipuladores eletrônicos, com chaveamento iâmbico, permitem transmissões perfeitas a velocidades incríveis. O QRQ obtido com um Teclado (Kei Board), sem dúvida, já muito se assemelha aos sinais de RTTY, cujo “Modus Operante” é análogo aos Decodificadores e Micros, com interfaces especiais para operação em Código Morse.

 

Contudo, é na destreza de uma manipulação tradicional, de cabeçote ou vibro, com suas manhas e trejeitos, que o cedáblio se torna um linguajar de características próprias e bem pessoais. Os QSOs são sempre realizados num clima de muita estima e cordialidade. E foi dentro desta comunhão fraterna que tive a oportunidade de trabalhar, além das Repúblicas Soviéticas, as Prefeituras do Japão e todos os Estados Americanos, incluindo o Alasca.

 

Da Europa e África faltam apenas alguns países, mas já tenho confirmadas diversas ilhas do Atlântico, Pacífico, Mediterrâneo e Mar do Caribe, bem como algumas Estações-Base operando na Antártica.

 

Antes de finalizar, queria ainda dizer o quanto aprecio e admiro os cartões QSLs que recebo. Confesso que alguns até me tocam um pouco, quer pelo singelo “design” de uns, ou pela verdadeira arte dos outros. Todos, porém, igualmente significativos, pois representam não só uma confirmação dos 130 países trabalhados, mas, também, da grande maioria dos aproximadamente doze mil QSOs em CW registrados no meu Diário. E decorando o meu pequeno “schack”, se encontram, além da maioria dos Diplomas outorgados pelos nossos Grupos de CW, o bonito e tradicional Certificado WAPY, com endosso para o PY0 e CW. Outros ainda foram conferidos pelo DARC, DIG e JARL.

 

Hoje, como membro operador do querido Morse Clube Gaúcho, contemplo o mapa-múndi e, ao verificar o número de países contatadas e as incontáveis amizades feitas ao redor do mundo, vejo que, de fato, ter aprendido o CW, esta verdadeira linguagem universal, tem sido um privilégio para mim. E, quando abraçado ao meu velho YAESU FT-200, saio à caça de uma rara estação DX, operando em Split, num “baita” pileup, vejo que o desafio ainda não terminou, apesar de veterano.”

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Colaboração: IVAN DORNELES RODRIGUES - PY3IDR 

email:  ivanr@cpovo.net 

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